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Aniversário / Vida na Irlanda

6 coisas que eu aprendi em 6 anos de Irlanda

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Na última sexta-feira, dia 2, completei meu 6º ano vivendo em Dublin.

Não sei se foi simplesmente o passar dos anos, ou se é parte da minha adaptação, mas tenho sempre a sensação de que eu sou uma pessoa muito diferente daquela que pisou aqui a primeira vez para ficar 6 meses. Eu já falava inglês, já conhecia parte da cultura e dos hábitos locais (pelo menos de ouvir falar), já tinha viajado, sempre gostei de frio, mas era ainda brasileira, bem brasileira.

Não que eu não seja hoje, ou que vá deixar de ser um dia, mas muitas das coisas que eram comuns na minha vida e que a gente dá como certas são só lembranças e não acredito que eu voltaria a me sentir em casa no Brasil.

Nesses 6 anos, entre outras coisas, eu aprendi:

1. A não me auto-medicar. Cada passada de olho pelas comunidades de brasileiros vivendo em Dublin (na maioria estudantes) me deixa um pouco chocada. Quanto remédio! Gente pedindo remédio (inclusive antibióticos), gente vendendo remédio (até o que se compra por aqui, a preços absurdos; fico com dó de quem paga €8 num comprimido para a gripe podendo comprar a mesma coisa por menos da metade do preço), gente trazendo um estoque digno de farmácia na mala.  Além de desnecessário é perigoso. O tempo e a convivência com o jeito irlandês me ensinou que a gente não precisa de tanto remédio, de tanto médico ou de tantos exames. Plano de saúde não cobre consulta (não sei se existe reembolso parcial, mas acho que não) e portanto a gente não vai ao médico a não ser que seja necessário MESMO. Meu filho nunca viu pediatra na vida e tá aqui cheio de saúde e fogo na bunda. Eu estou no finalzinho da segunda gestação sem nunca ter sido examinada por um obstetra, e tudo bem.

2. A limpar sem exagerar. Sabe aquela limpeza pesada que a gente faz na casa no Brasil uma vez por semana? Dessas de lavar o chão dos banheiros, da cozinha, limpar as jantelas? Lembro que a minha mãe com frequência tirava as cortinas para lavar, lavava os azulejos, a calçada, tirava tudo dos armários. Subia escada, se pendurava, passava o dia todinho limpando. Então, esquece. Por aqui o mais próximo disso é feito, para você ver, uma vez por ano, e se chama spring cleaning (a limpeza antes da primavera chegar onde aproveita-se para guardar as roupas de inverno, cobertores e etc). No dia-a-dia a maioria das pessoas faz o básico mesmo, pano molhado, aspirador de pó e lencinho umedecido para tudo que é função. E olhe lá, viu? Confesso que eu vivo num meio termo, estou longe de ser a minha mãe mas mantenho a casa sempre limpa e arrumada. Percebi que ninguém morre porque eu não passo meu final de semana colocando a casa do avesso para limpar mas adoro uma casa limpa e cheirosa. A exceção foi agora, com a mudança, que eu fiz questão de limpar tudo para depois ficar mais fácil de manter.

3. A não depender do clima. Marquei de sair, vai chover. Quando cheguei aqui pensava duas vezes antes de tomar chuva e desmarcava. Hoje não tem literalmente tempo ruim. Até porque se a gente for depender de tempo bom para fazer qualquer coisa ninguém saia de casa.

4. A não fazer dívidas. Confesso que sempre fui muito desorganizada com dinheiro e no Brasil vivia enrolada, pagando o mínino no cartão de crédito e não guardando um centavo do salário. Aqui não corro esse risco. Não tenho mais cartão de crédito (aqui não se parcela compras no cartão mesmo) e por não haver possibilidade de parcelamento, carnê ou dívida de sangue, pago tudo a vista. Ou seja, se não tenho, não compro. Aprendi também a ser muito menos consumista, mesmo porque por conta disso o que eu compro nunca é por impulso (precisa caber no orçamento mensal).

5. 13º salário é luxo (e é bom) mas nem faz tanta falta. Por lei não existe e algumas empresas pagam no máximo um bônus de Natal. I. ganha todos os anos (normalmente em forma de gift card e o valor varia muito dependendo da situação financeira da empresa naquele momento) mas nós já aprendemos a NUNCA contar com esse dinheiro. Quando ele chega é realmente isso: um bônus. Um extra que a gente acaba usando em janeiro para comprar algo que precisamos ou gostaríamos de ter, não para pagar dívidas de Natal ou comprar presentes. Pelo mesmo motivo os presentes aqui, pelo menos na minha família (o que não quer dizer que seja igual em todas), nunca são exagerados. A impressão que eu tenho (e de novo, isso não é um fato) é que o Natal aqui é muito menos consumista do que no Brasil.

6. Que o tempo passa. Ou melhor, que a gente vê o tempo passar em forma de estação do ano. Parece uma bobagem enorme, mas para mim isso foi fundamental, no sentido de aprender que tudo passa, que os dias voltam a ficar claros, que de repente dá para sair de casa sem casaco, que as flores nascem e deixam tudo colorido, da mesma maneira que as folhas caem e preparam a gente para a consequente chegada do inverno e de muita escuridão novamente. Funciona para mim como um lembrete de que isso é vida e de que tudo tem seu ciclo. No Brasil, as estações se misturam, não notamos dias mais claros ou mais escuros, parece tudo sempre igual.

Nesses 6 anos eu só tenho a agradecer o golpe do destino que me fez vir para cá, e o outro, ainda maior, que me fez ficar.

N.

About Author

42 anos; brasileira que mora na Irlanda; mãe de um filhote de irlandês do cabelo vermelho e muito fogo na bunda, de uma pimentinha de olhos grandes e curiosos e de uma caçulinha que é só sorrisos.

9 Comments

  • Ana Paula
    January 5, 2015 at 9:11 pm

    Aqui a mesma historia, não poderia concordar mais. Adorei a parte do tempo, que realmente passa marcado pelas estações. Não havia pensado assim, mas hoje mesmo quando ia pra casa fiquei reparando no ceu que as 5 da tarde nem estava tao escuro. Fique feliz porque de longe a primavera se avista…
    Bjs e um feliz 2015 para voces todos! X

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  • Camila Lins
    January 5, 2015 at 10:27 pm

    Lindo post!

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  • Raquel
    January 11, 2015 at 3:18 pm

    Ai que barato! Amei tudo!
    Isso das estacoes do ano eh um fato! Aqui estamos sempre fritando de calor…
    Sobre o seu golpe do destino, esse ano estounoara embarcar pra Irlanda pra visitar o namorado, fico numa duvida cruel entre ir pra estudar (ja sei ingles e seria so uma desculpa para ficar mais tempo legalmente…mas eu estaria indo pra mayo e nunca achei cursos desses por la, sempre vejo pra dublin ou cork)
    Ou se vou msm como turista e adianto as coisas (queremos nos casar).
    Enfim, mto bom ver sua historia dando certo e q bom q vc se adaptou! Felicidades pra vc e sua familia!

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  • Elaine Pessoa
    December 29, 2020 at 3:19 pm

    Que texto ótimo! Também aprendi muito disso , em 3 anos de Irlanda. Só preciso me desapegar da faxina semanal…

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