Menu
depressão / Gravidez

26 semanas e o lobo na porta

I keep the wolf from the door
But he calls me up
Calls me on the phone
Tells me all the ways that he’s gonna mess me up

(Radiohead)

Estou enrolando há mais de um mês para escrever sobre esse assunto. Por falta de tempo, e na maioria das vezes, por medo de me faltar estrutura para escrever e consequentemente ter que enfrentar isso de novo. Precisei de um tempo a princípio para assimilar e aceitar algumas coisas, mas agora chegou a hora de admitir que o lobo continua lá. Muito provavelmente vai sempre estar lá e eu preciso aprender a conviver com ele.

Quem tem depressão uma vez corre um risco de 50% de ter a doença de novo. Depois do segundo episódio, pasmem, esse número aumenta para 90%.

O fato é que depois de 3 anos me vi novamente sentada na sala de espera de um consultório psiquiátrico.  Numa situação muito diferente dessa vez, já que não estou com depressão. Aliás, ao contrá rio (e não consigo pensar em duas situações tão opostas quanto essas duas), nunca estive tão feliz quanto agora.

Diferente também porque estou grávida. Tão grávida que não dá pra esconder. Daí quando sentei lá (o consultório fica dentro da própria maternidade), fiquei pensando no que todas as pessoas de passagem por ali pensavam sobre a grávida com algum tipo de doença mental.

Se tem uma coisa mais difícil do que estar em depressão é lidar com o preconceito que vem com a doença. Com o perdão pelo exagero que eu posso estar cometendo, é praticamente a mesma coisa que ter AIDS nos anos 80. Acho até que a coisa piora ainda mais quando a depressão é depressã o pós-parto. Quando voce tem câncer as pessoas automaticamente ficam com pena. Mas quando a doença é depressão, na maioria das vezes (não estou generalizando nem afirmando que todo mundo reage da mesma maneira), a pena vem acompanhada de uma aura de ignorância. As pessoas tendem a não considerar depressão como doenca, mas como fraqueza. “Frescura” foi a palavra que mais ouvi para descrever o que eu passei durante o primeira crise.

Daquela primeira vez eu, recém saida da adolescência, ainda me importava (e muito) com o que outros achavam ou deixavam de achar. Evitei contato com todo mundo para não ter que admitir que estava com depressão. E durante muitos anos me recusei a falar a respeito.

A segunda crise veio com 10 anos de diferença e me encontrou além de mais velha, mais preparada. Reconheci os sistomas com muito mais rapidez, agi mais rápido e consequentemente me recuperei muito mais rápido. Também pouco me importei com a ignorância alheia. A partir de então, nunca fiz propaganda, mas falo sobre o assunto abertamente e sem um pingo de vergonha.

Estresse pode causar úlcera e outras tantas outras doenças. Em mim causou depressão. Se alguém acha que sou fraca por causa disso, problema deles e não meu.

O big deal dessa vez é que fui a consulta crente que estava bem. Ou melhor, que tinha meu estresse sob controle. Naquela ocasião não vi o psiquiatra, mas uma enfermeira especializada em saúde mental. Obviamente ela atende os novos pacientes e faz uma espécie de triagem para ver quem precisa realmente uma consulta com o psiquiatra.

Não consegui “enganá-la”. Em aproximadamente 2 horas de consulta/terapia ela conseguiu identificar o meu “gatilho”, ou seja, a causa dos meus episódios de depressão. Eu levei muito mais de 10 anos (e com auxílio de terapia e consultas psiquiátricas) para chegar a mesma conclusão: eu me estresso. Mais do que o que é considerado normal e saudável e com as menores das coisas pequenas. Quero ter tudo sobre o meu controle, tudo do jeito que eu planejei e reajo de uma maneira quase ridícula quando as coisas seguem outro caminho.

Segundo a tal da enfermeira, naquele momento ela via meu nível de estresse como girando em 7 (numa escala de 0 a 10). Uma pessoa “normal” deveria manter esse índice em torno de 5-6, já que a falta de estresse também significa problemas.

Eu vivo bem com o tal do índice alto assim. O problema, ainda segundo ela, é que com a chegada de um bebê vai ser praticamente impossível que esse número não aumente. E aí, bom aí, eu vou acabar beirando a insanidade de novo.

Para evitar que isso aconteça são grandes as chances de eu ter que voltar a tomar antidepressivos ainda durante a gravidez. Na verdade, ela foi enfática: melhor encará-los agora, mantendo o lobo lá fora, enquanto estou bem, do que esperar até o babóg nascer e aí ter que expulsar o lobo de dentro de casa.

Tudo isso me foi falado da maneira mais clara (e doce, se é que se pode dizer assim) possível. Aliás, gostei da enfermeira. De todas as pessoas que já me atenderam durante todo o pré-natal, foi com ela que me senti mais confortável e melhor cuidada.

Saí de lá com uma consulta marcada para ver o psiquiatra mesmo, que vai dar sua opinião quanto a prescrição dos antidepressivos. E também com uma lista de terapeutas behavioristas (já que a terapia tem que ser feita junto com o uso dos remédios) e uma lista de websites bem bacanas que tratam do assunto. Ela também aconselhou que I. vá comigo à próxima consulta, o que eu achei muito bom pra nós dois.

Saí do consultório bem. No entanto, a ficha foi cair ainda na recepção do hospital (onde esperava por I., já que naquele dia tínhamos consulta para a ultra-som). Acabei chorando. E chorei por alguns dias depois da consulta.

Foi como se eu tivesse tomado um balde de água fria na cabeça. Eu que achava que estava indo tudo tão bem. Eu que sabia das chances de ter depressão (inclusive pós-parto) de novo. Ouvir assim da boca de outra pessoa, alguém que faz isso o dia inteiro, que VAI acontecer de novo, não foi fácil.

Mas nada nunca é.

N.

About Author

42 anos; brasileira que mora na Irlanda; mãe de um filhote de irlandês do cabelo vermelho e muito fogo na bunda, de uma pimentinha de olhos grandes e curiosos e de uma caçulinha que é só sorrisos.

6 Comments

  • Ernani
    January 13, 2011 at 9:53 am

    Só a coragem de botar o assunto assim para o mundo já deve ajudar tanto quanto horas de papo com o terapeuta. Vc provavelmente se estressa assim porque sente demais as coisas, as boas e as más. É triste que viver tudo intensamente tenha efeitos colaterais. Se depender da torcida dos tios, Babog vai é contrariar a previsão da enfermeira e fazer sua vida mais fácil e feliz. Ok, ok… vamos encarar os fatos. Mais fácil não vai ser de jeito nenhum. Mas a chance de ser mais feliz é enorme. E se sua felicidade for nível 10, seu estresse 7 não vai resistir…
    Bjo grande e conte com os amigos daqui a qualquer hora

    Reply
  • Sandre
    January 13, 2011 at 12:20 pm

    Te acompanho de longe e torço muito pra que as coisas fiquem bem. Te desejo força e muita alegria, pra vc, pra I. pro seu nenê. Beijo!

    Reply
  • ka smith
    January 13, 2011 at 4:59 pm

    Olha Ni, essa não é de longe a personalidade que eu vejo que mais se destaca em você, nunca te senti depressiva e acho que a gravidez está te fazendo muito bem, você está linda, plena, brilhando ao lado do marido que te ama e que faz tudo por você (um site e um filho!), e com certeza é o lugar que muita gente daria tudo pra estar. Você É FELIZ, curta esse momento sem neuras, algumas perguntas, muitas dúvidas e drama desnecessário estressa, curta cada dia de uma vez e você vai sair dessa ilesa, com um filho saudável e tudo, tu-do, vai dar certo!

    Reply
  • Angela
    January 15, 2011 at 1:56 am

    Oi querida…
    Na minha família todos os problemas de saúde sempre foram levados no Isso não é nada, vai ficar tudo bem. A depressão da minha mãe é levada desse jeito e ninguém – inclusive eu – nunca se preocupou em levá-la ao médico ou de pelo menos falar abertamente sobre isso com o resto da família. Quem tem tendência a depressão sabe que não é tão fácil afastar o monstro. Por isso, se cuida, tá?
    A gente está aqui, muito longe, mas sempre pensando e torcendo por você.
    Um beijão.

    Reply
  • Maria Emilia
    January 15, 2011 at 11:32 pm

    Oi…Já tive 3 grandes crises de depressao desde a minha adolescencia (hj tenho 33 anos). Concordo com vc, as pessoas que não conhecem essa doenca realmente tendem a mal interpretar pessoas com esses sintomas, realmente ao inves de ajudarem elas quase que atrapalham mais. Mas aprendi depois de muito a nao me importar com o que as pessoas vao pensar sobre isso (se é frescura, se estou querendo chamar atencao, ou sei lá). Sinceramente nao sou especialista na área, sou apenas uma pessoa que sofreu com isso, hj estou feliz, e nao fico me martirizando pensando que “ó, isso VAI acontecer comigo novamente”, eu simplesmente nem penso nisso, tento seguir a minha vida feliz, ocupando minha mente com coisas que eu gosto…Não foque e nem gaste suas energias pensando no que pode acontecer, e que vai acontecer. Não sofra por antecipacao por uma coisa que talvez nem venha a acontecer. Canalize sua energia em coisas boas, no seu bebe. Nota: Respeito o tratamento que vc comecou a fazer e quero deixar claro q nao sou contra, pelo contrario, é isso mesmo….mantenha o lobo lá fora. Força!!! E nao deixe a peteca cair, nunca!!!

    Reply
  • Karina M.
    January 17, 2011 at 10:44 am

    Nivea,

    Acho que dessa vez eu vou conseguir postar o meu comentário. rsrs
    Eu entendo tudo o que você disse, pois sofro com o mesmo problema. Eu me estresso e me importo demais com as coisas.
    Mas a gravidez me tornou uma pessoa mais reflexiva. Cheguei à conclusão de que não vamos mudar as coisas e as pessoas. Quem tem que mudar somos nós. Temos que procurar uma forma de viver com essas coisas que não nos prejudique.
    Agora, no meio da gestação, eu tô me sentindo mais sensível. O médico diz que são os hormônios. Sinceramente, eu não creio que seja só isso. Acho que a minha ficha caiu em relação a algums coisas e anda difícil de digerir. Mas tenho fé e força de que vai dar tudo certo.
    Vai ficar tudo bem! Nossos bebês vão nascer super bem e vamos ficar melhor ainda.
    Força e é fé sempre!

    Beijos

    Reply

Deixe uma resposta para Karina M. Cancel Reply